Os Livros Ardem Mal

O Estranho Caso de Benjamin Button

Posted in Cinema, Crítica by Catarina Maia on Terça-feira, 17-02-2009

O Estranho Caso de Benjanin Botton

 

Upon a closer look, there is nothing normal in our universe.
Everything, even every small thing is a miraculous exception.
View from a proper perspective, every normal thing is a monstrosity.
Why should we take horses as normal and the unicorn as a miraculous exception?
Even the horse, the most ordinary thing in the world, is a shattering miracle.

Slavoj Zizek

 

Não há nada normal no nosso universo, diz-nos Zizek. Por mais pequeno que seja, todo o ser é resultado de infinitas variações e complexas combinações, na sua maioria, para não dizer totalidade, meros frutos do acaso. E, por isso, se virmos bem, somos todos milagres. Somos todos monstros. Todos excepções.

O Estranho Caso de Benjamin Botton, de David Fincher, não é um filme sobre uma aberração. Não é um filme que tenta humanizar uma aberração ou mostrar como os homens podem ser mais feios que a besta – como de certo modo acontece, por exemplo, em O Homem Elefante (1980) –, este é um filme sobre milagres. Apesar de inicialmente ser rejeitado e abandonado pelo pai, o modo como Benjamin, aquele pequeno “bebé velho”, é recebido por estranhos, a maneira como a sua mãe adoptiva, Queenie, se refere a ele é, justamente, como um milagre:

He is a miracle, that’s for certain… just not the kind of miracle one hopes to see…

Mas aqui o uso da palavra milagre está ainda muito associada à religiosidade. O momento em que esta outra noção de milagre de que falo, e que é mais próxima daquela proposta por Zizek , se torna mais clara para mim é no discurso de um bêbado, o Capitão Mike. Ele está num bar onde se encontram outros marinheiros de várias nacionalidades, que falam várias línguas, e discursa entusiasmado sobre a tatuagem de um colibri que tem desenhada sobre o seu coração. Ele conta isto a um russo com a ajuda de tradução simultânea:

This isn’t just another bird! Its heart rate’s twelve hundred beats a minute! Its wings beats eighty times a second! If you was to stop their wings from beating, they would be died in less than ten seconds… This is no ordinary bird, this is a frikkin’ miracle!

Como o cavalo de Zizek, o colibri funciona aqui como o símbolo do extraordinário dentro do ordinário. O colibri surge pelo menos outras duas vezes no filme: quando o Capitão Mike morre e, já no final, momentos antes de Daisy (o grande amor de Benjamin) morrer também. Como é evidente, isto não acontece por acaso. É até, de certa forma, pouco subtil a sua súbita aparição nestes momentos, como que a dizer-nos que estas pessoas eram, como o colibri, verdadeiras excepções, seres maravilhosos, extraordinários.

A verdade é que o filme não precisava disto. Apesar de achar que a estratégia narrativa usada está um pouco gasta (a mãe que, no leito de morte, conta à sua filha a verdadeira história sobre o seu pai), o filme consegue na perfeição dar uma impressão simultânea de normalidade e de absoluta excepção a esta personagem estranha de Benjamin (como todos sabem, um ser que “cresce ao contrário”, nasce com aspecto de velho e morre um bebé), assim como à de todas as outras personagens. Todos são especiais. Únicos.

Esta ideia é, por assim dizer, “sintetizada” numa série de flashes conduzidos pela voz de Benjamin (Brad Pitt) onde somos lembrados, uma a uma, das várias personagens que conhecemos durante o filme, da singularidade de cada uma delas. E Benjamim começa com Mr. Daws, o homem que foi atingido sete vezes por um raio:

“Some people… get struck by lightning…”
 “Some are born to sit by a river.”
“Some have an ear for music…”
“Some swim the English Channel…”
“Some know Shakespeare…”

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