Silêncios
A fotografia testemunha a dimensão vivamente expressiva do silêncio. Sinal primário da arte fotográfica, a suspensão no tempo da imagem captada com a câmara e a utensilagem técnica da qual ela se serve retira-a do estrépito dos dias, reforçando e diversificando por esse meio a sua conformação simbólica. O «trabalho do silêncio», como lhe chama Eni P. Orlandi, impõe assim o seu papel fundador na relação do sentido com o imaginário. E n’A Câmara Clara, Barthes fala de um «saber fotográfico» que nenhuma outra forma de reconhecimento do mundo pode comunicar.
Mas quando ao silêncio da fotografia se associa o silêncio como objecto fotográfico, a intriga de sentidos torna-se explosiva de tão veemente, enérgica, que se apresenta ao olhar. Podemos observar agora um novo episódio desta apoteose que grita em Silêncios/Silences, um álbum bilingue de Eduardo Gageiro editado sem editora e sem apoios oficiais. São perto de 180 imagens a sépia, instantes captados em Portugal e mundo afora entre 1955 e 2007, que se nos impõem intimamente pela forma como os silêncios representados nos calcam e nos emudecem. O texto de Lídia Jorge que as antecede comenta algures: «Eu experimentei, e agora sei que somando silêncio mais silêncio, mais silêncio, e ainda mais silêncio, assim infinitamente somados, dessas parcelas todas, nunca resultarão silêncios».
Eduardo Gageiro (2008), Silêncios/Silences. Prefácio e epígrafes de Lídia Jorge. S.l.: s.e. 200 p. ISBN: 978-972-96469-3-5
Rui Bebiano
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