Os Livros Ardem Mal

Cravan (II)

Posted in Autores, Notas by Pedro Serra on Quarta-feira, 26-03-2008

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Domingo Sánchez Blanco, Autorretrato.

Que dizer, que dizer sobre o Primeiro Campeonato Mundial de Poetas Pesados? A situação foi esta: nem abstracção, nem acção, nem acontecimento, nem agressão, nem amor, nem anormalidade, nem antiguidade, nem anti-sistema, nem apostolado, nem apoteose, nem aprendizagem, nem arquétipo, nem artesanato, nem aura, nem autenticidade, nem auto-criação, nem autoridade, nem auto-suficiência, nem bens, nem cabelos compridos, nem cegueira, nem céu, nem chocolate, nem claustrofobia, nem contemplação, nem contorções musculares, nem copistas, nem coração, nem crânios, nem crueldade, nem delícia, nem delinquência, nem delírio, nem demência, nem depressão, nem desassossego, nem desespero, nem desmedida, nem destreza, nem desvio, nem devoção, nem dialéctica, nem disciplina, dissidência, nem dívida, nem divisão social do trabalho, nem doença, nem dons inatos, nem dor, nem educação, nem elitismo, nem embriaguez, nem emulação, nem engenho, nem ensimesmamento, nem entranhas, nem entusiasmo, nem epilepsia, nem erotismo, nem erro, nem escola, nem escravo, nem escuridão, nem escuta, nem esforço, nem especulação, nem espírito, nem espontaneidade, nem estupidez, nem excepcionalidade, nem exercício, nem experiência, nem êxtase, nem faculdade, nem faíscas, nem fanatismo, nem fantasia, nem fascinação, nem favoritismo, nem fealdade, nem felicidade, nem fetichismo, nem filiação, nem fingimento, nem físico, nem flecha, nem fogo, nem fonte, nem freak, nem frenesim, nem furor, nem genialidade, nem glória, nem gosto, nem graça, nem halo, nem hedonismo, nem herói, nem homo literatus, nem honras, nem humanidade ideal, nem ignorância, nem iluminação, nem ilustríssimos, nem imediato, nem imitação, nem ímpeto, nem inadaptados, nem inarmonia, nem inchaço vazio ou viciosa inchação, nem incompreensão, nem inconformismo, nem inconsciência, nem incultura, nem inspiração, nem instinto, nem instrumentos, nem intimidade, nem intestinos, nem intuição, nem irracionalidade, nem lágrimas, nem liberdade, nem língua de fora, nem lucidez, nem magia, nem maldição, nem mania, nem martírio, nem maturidade, nem mecanismo, nem mediato, nem medida, nem melancolia, nem mensurável, nem mérito, nem microcosmo, nem mimo, nem missão, nem mistério, nem moda, nem modelo, nem modernidade, nem moradas, nem moral, nem mudança, nem natura naturans, nem natura naturata, nem naufrágio, nem néctar, nem nervos, nem neurose, nem nobreza, nem novidade, nem observação, nem ofício, nem olfacto, nem oráculo, nem origem, nem originalidade, nem paciência, nem paixão, nem pedantes, nem pés, nem peso, nem poética, nem porta-vozes, nem possessão, nem pouco esforço, nem precocidade, nem privilégios, nem profecia, nem progenitores, nem psicobiografia, nem pulsão, nem Q.I., nem queda súbita, nem racional, nem ranger de dentes, nem raro, nem razão, nem rebeldia, nem rebuçados, nem regras, nem revelação, nem rito, nem sacrifício, nem sangue, nem sensações, nem sensibilidade, nem sentimento, nem singularidade, nem sobre-natureza, nem sofrimento, nem sombra, nem sorte, nem stercore, nem subjectivização, nem substancialização, nem talento, nem torrente, nem tortura, nem trabalho, nem transe, nem transgressão, nem turbulência, nem utilidade, nem venenos, nem veneração, nem verdade, nem vermes, nem vibrações, nem vício, nem vidência, nem vinho, nem violência, nem vítimas, nem voz interior, nem voz primigénia… Nem isto, nem o inverso de tudo isto, que também foi verdade. Que dizer sobre o combate “Tiger Tiger Escarpa” vs. “La Tanquetilla de Fresno” e sobre os três assaltos do combate “El Tigre de Gales” vs. “El Boss Sexuador”? Como performance (colectiva) que foi, terá sido uma pós-performance na linha de A destajo. 500 performances en un dia de Domingo Sánchez Blanco, frenética e assumidamente ridícula/risível passagem à acção para esgotar o corpo que age. Cansar fisicamente o corpo, esgotar o agonismo do ditame da passagem ao acto: porque, no fundo, só um cansaço físico assim pode chegar a trazer-nos a renúncia dos textos.

Pedro Serra

Domingo Sánchez Blanco (2005), A Destajo. 500 performances en un día. Murcia: CendeaC. 318 pp. ISBN: 84-6094-276-7.

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